Essa postagem é uma sugestão da Fabiana, leitora
do blog, e confesso que é um tema que me identifiquei muito.
Em minhas palestras
sobre como enfrentar e superar o medo de dirigir tem um ponto em que faço
questão de tocar: a individualidade, a liberdade e a independência de cada um.
Isso porque em algum momento de nossas vidas vamos nos ver sozinhos apesar da
família, dos amigos, das pessoas que nos rodeiam.
Um amigo já me dizia:
"nascemos sozinhos e morremos sozinhos". O teu filho não vai morrer com você, o
teu marido, noivo, namorado, tua mãe, o teu melhor amigo não vai morrer com
você.
Na vida como no trânsito a gente vive
compartilhando espaços na nossa vida e na dos outros, mas já repararam como
passamos a maior parte do tempo sozinhos? Podemos dividir tudo, mas o nosso
pensamento, por mais que tentemos compartilhar, são só nossos. E são nossos
pensamentos que orientam as nossas ações.
A todo momento tomamos nossas decisões
sozinhos. Até podemos pedir opiniões, mas as decisões quem toma somos nós.
Portanto, se algo der errado, sabemos que foi por conta de uma decisão nossa. E
assim é no trânsito.
Há motoristas iniciantes que só saem com o carro
se tiver alguém do lado. Às vezes a dependência da figura do carona é tão grande
devido a nossa insegurança, que nos sentimos mais tranquilos mesmo quando o
carona não sabe dirigir, não é sequer habilitado; a falta de apoio, o pedido de
socorro é tão grande e necessário que inclusive suportamos os caronas mal
humorados, sem paciência, exigentes, que nos xingam e tratam mal só para não
sairmos dirigindo sozinhos.
Um grande erro, perigo e risco é quando o
motorista iniciante, com medo de olhar no retrovisor, pede para que o carona
olhe e diga se "dá prá ir" ou "se dá prá mudar de faixa". Isso porque no volante
do carro o motorista é dono e senhor de seus atos; ele é quem olha, quem
percebe, quem avalia, quem toma as decisões de acordo com os seus sentidos, com
a velocidade em que capta a realidade, de acordo com o seu tempo de reação.
Se o
carona sabe dirigir e é experiente piora, pois ele vai te cobrar uma prática que
você não tem, vai exigir uma destreza, uma habilidade que você não tem. Um "vai
que agora dá" de um mtorista experiente pode ser que dê para ele, mas não para o
motorista iniciante, que ainda não tem prática.
Mas porquê será que o motorista iniciante, mesmo
morrendo de raiva, nervoso, inseguro, triste por ser ofendido, xingado,
desrespeitado nas suas possibilidades de dirigir, ainda quer, se sujeita a sair
dirigindo com um carona desses do lado?
A resposta é: porque se sente inseguro,
porque tem medo de bater, de acontecer alguma coisa enquanto dirige e porque
essas pessoas (caronas) que xingam, que gritam, que perdem a paciência, que
dizem que você não nasceu para dirigir, que é uma "burra", um "burro" são
aquelas em que mais confiamos. São maridos, namorados, noivos, irmãos, primos,
aqueles que o motorista iniciante admira como motorista, são os melhores
exemplos de motoristas com quem eles imaginam e gostariam de aprender.
Quantas vezes a pessoa se pega pensando: "vou
convidar meu marido prá me ensinar a dirigir, porque ele dirige há anos", ou
porque ele dirige bem, ou porque é o melhor motorista que conheço? Daí, essa
pessoa em quem confiamos tanto e esperamos o mínimo de paciência nos xinga,
manda voltar para a autoescola, pergunta porque nos deram a carteira de
motorista, e por aí vai. Ficamos tristes, magoados, choramos, ficamos nervosos,
dá um "branco" e aí é que o acidente acontece. Depois, não adianta pedir
desculpas porque já machucou, já magoou, já deixou prá baixo, já jogou nossa
auto-estima na lona.
Uma coisa é fato: você ter um, dois, quatro
caronas dentro do carro, mas ele não pode ser os seus pés (quem pisa na
embreagem, acelera ou freia é o motorista), ele não pode ser suas mãos (quem
comanda o volante e o câmbio de marchas é o motorista), ele não pode ser os seus
olhos (quem registra a imagem, a processa e toma decisões, reage no trânsito,
comanda o automóvel é o motorista).
Muitas vezes ficamos mal acostumados, nos
acomodamos na zona de conforto de ter alguém para dirigir pela gente e aí vem
aquele "meu marido me leva" mesmo com a cara amarrada, mas leva.
A gente se
acostuma a ter pessoas que pensam e decidam pela gente e vem aquele "amor, o que
é que eu faço" como se outra pessoa subesse o que é melhor prá gente além de nós
mesmos. Criamos uma dependência, condutores.
Lembro que depois que me separei e
saí de um relacionamento de 8 anos parecia que o mundo ia acabar: não sabia mais
nem atravessar a rua sozinha. E isso também acontece com quem está
(re)aprendendo a dirigir e estava acostumado, ate então, a ter alguém dirigindo
por ele, decidindo os trajetos por ele, escolhendo as ruas onde entrar. E agora
que estou sozinho na vida e no volante?
Recebo muitos e-mails e postagens nas redes
sociais de pessoas que contam suas histórias: são pessoas que ficaram viúvas e
perderam o marido ou a esposa motorista para sempre; são motoristas jovens com
medo de dirigir que tem parentes, pais, filhos doentes ou deficientes e que
precisam levar ao médico, às consultas, mas travam por causa do medo de dirigir.
São pessoas que se separaram e perderam o motorista, a facilidade de alguém
dirigindo por eles. A vida nos prega essas peças e nós ficamos lá, com o carro
na garagem olhando prá gente doidinho prá fazer amizade conosco e sair no
trânsito, mas travamos.
O MOTORISTA INICIANTE E OS MONSTROS
IMAGINÁRIOS
O mal de todo motorista iniciante (e falo por
mim também porque já passei por isso) é que só de pensar em sair com o carro já
começa a tremer, suar, sente a garganta seca, as pernas tremem; alguns tem ânsia
de vômito, tonturas e até desmaiam. Tudo isso por causa dos fantasmas, dos
monstros imaginários que só existem na nossa cabeça. Querem exemplos?
1. a pessoa só de pensar em sair com o carro já
imagina o trânsito de doido, carro por todo lado, na frente, atrás, do lado....
ai meu Deus! Pronto: já é suficiente para o corpo responder e somatizar,
incorporar aquelas sensações, responder com suores e calafrios. Gente, foi só a
mente produzindo imagens, mas as sensações são reais, e daí já é motivo de
deixar o carro na garagem pelo resto da vida;
2. a pessoa se imagina atrapalhando o trânsito
quando na verdade cada motorista que está no trânsito está bem mais preocupado
com seus assuntos, seus compromisso, suas próprias vidas. Tanto é que nenhum
motorista dirige pensando se o outro é habilitado há 50 anos ou se saiu da
autoescola ontem;
3. a pessoa pensa em pegar o carro e lá vem a
imagem dela mesma atropelando alguém, batendo no carro dos outros, etc... quando
na verdade, ao alimentar esses pensamentos, deixa de focar no principal: se eu
der distância de 2 carros do carro da frente eu não bato em ninguém; se eu
dirigir prestando atenção eu vou me antecipar aos perigos da via; se eu dominar
bem os comandos de meia embreagem, se eu souber frear suave e gradualmente o
carro não vai soquear; e por aí vai, mas muitos preferem ir para o trânsito de
sopetão antesde treinar os fundamentos básicos de direção num lugar calmo,
tranquilo, com o carro quase parando, em velocidade baixíssima, sem riscos à
segurança. Assim não dá gente, isso é queimar etapas.E o que acontece? nem entra
no carro e já está doente do medo;
4. muita gente acha que o carona experiente vai
ensinar melhor, vai acalmar, vai fazer mágica, e não faz. E aquele carona que
critica os treinos em ruas calmas e tranquilas, andando com o carro para frente
e para trás? Pior que ele é o carona que diz, afirma e incentiva a ir aprender
no trânsito logo de cara, como eles aprenderam um dia. Ledo engano, condutores:
eles aprenderam em outra época, com menos trânsito, com ruas com menos carros,
com carros que não tem a tecnologia de motores de hoje e numa época em que
segurança no trânsito não era tão fundamental quanto hoje em dia;
5. Há o motorista que admiramos e que esperamos
que nos ensine mesmo com os vícios horríveis de andar com o carro pisando no
pedal de embreagem, colocando a mão em cima do câmbio; cruzando as mãos e braços
no volante; dirigindo com o braço para fora ou assando em lombada na diagonal.
OS OUTROS MEDOS E INSEGURANÇAS QUE TRAZEMOS PARA
DENTRO DO CARRO
O medo de dirigir vem de outros medos que temos
na vida. O medo de dirigir vem da falta de domínio do carro. O medo de dirigir
vem, também, da dependência que temos dos outros. Imagine um pai que faz os
deveres, tarefas, a lição de casa pelo filho. O que esse filho vai aprender?
Nada.
Imagine um marido que dirige pela esposa, que
decide tudo por ela. Na hora em que ela precisar de independência para tomar uma
decisão, como vai agir? Ou não vai agir, né?
Imagine uma pessoa que passou boa parte da vida
sendo superprotegida, desencorajada, diminuída, subestimada, ouvindo: "voce
nunca vai conseguir"; "você não nasceu prá isso"; "você é muito frágil" ou "você
é muito burra", dentre outras coisas. Como vai dirigir, se dirigir exige
independência, tomada de decisões certas na hora certa, exige atenção, firmeza,
exige um autocontrole que essa pessoa não aprendeu a ter?
Daí, por dificuldade de enfrentar os próprios
medos da vida, essa pessoa passa a pensar que o medo dela é patológico. Procura
psicólogo, paga aulas para habilitados, faz terapia, procura tudo que é saída e
nada. Porquê? Por quê o psicólogo vai aplicar técnicas de mudanças de
comportamento que não vão adiantar se a pessoa se fechar nesse medo. O instrutor
para habilitados vai se matar tentando ensinar de tudo que é jeito, mas o
motorista nada. Desanima, perde a confiança em si mesmo, fica com a auto-estima
na lona e decide engavetar a CNH de vez.
Você quer aprender a dirigir? Quer superar o
medo de dirigir? Então tenha um motivo para isso. Saiba para quê você quer
dirigir, porque você quer dirigir. É por você ou porque os outros querem ou
cobram?
Torne significativo o ato de dirigir. Associe o
ato de dirigir a coisas boas, a emoções boas, positivas e busque isso para a sua
vida.
Esteja disposto a enfrentar seus medos, a não
depender dos outros para as coisas mais simples da vida; reconheça-se como um
ser individual (não individualista), capaz, único, que tem o seu tempo certo
para tudo. Não se compare aos outros porque ninguém é igual.
Nem todas as partes
do corpo que temos duplicados (mãos, olhos, pulmão, rins) são iguais. Não se
compare a um motorista que já tem anos de CNH, que já tem prática. Não queira
ounão caia na ilusão de ainda na PPD querer dirigir como um motorista experiente
se não estiver disposto a treinar, a praticar.
Pare de se colocar nas mãos dos outros; levanta
essa cabeça, olha de frente prá vida, para os seus medos mais profundos e decida
vencê-los com paciência, com determinação, com fé em Deus, em si mesmo e na sua
capacidade de aprender.
Antes de ir para o trânsito domine a meia
embreagem para o carro não morrer; acolha-se emocionalmente; veja-se como
aprendiz capaz de aprender sempre, de melhorar sempre; liste suas dificuldades
para dirigir por ordem de prioridade; tenha calma, faça tudo com paciência, com
determinação. Busque mais de uma solução para o mesmo problema, não se entregue,
não se coloque nas mãos dos outros porque você é muito mais do que isso.
No carro, o motorista está o tempo todo sozinho;
vai dirigir sozinho; vai terde aprendera confiar em si mesmo porque é o seu
melhor amigo, orientador e protetor nessa hora. O motorista manda, o motorista
trava se alguém está sem cinto; o motorista passa segurança para si mesmo; o
motorista acredita em si mesmo; o motorista toma suas próprias decisões e não
permite que palpiteiros se intrometam na sua tarefa de dirigir com
responsabilidade, com segurança.
O motorista, quando pratica, quando treina em
ruas calmas, quando repete mihões de vezes o mesmo exercício é um guerreiro que
está afiando a sua espada e adestrando suas habilidades. Pensem nisso,
condutores!
Treinem, pratiquem. Nã ajam nem pensem que o carro tem vida própria.
Ele só faz o que você manda, o que você quer. Torne o ato de dirigir
significativo, seguro, enfrentem seus próprios medos e logo descobrirão o
prazer, a paixão e a arte de dirigir que está dentro de
vocês!